terça-feira, 1 de março de 2011

Reino


 Daniel Lago

Jornalista formado pela UFRJ, doutor em Linguística pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e professor de Filosofia da Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), tendo estudado hebraico na Sinagoga ARI, em Botafogo – RJ.

Versículos famosos, se analisados à luz da cultura judaica antiga, assim como através do idioma hebraico, trazem à tona verdades espirituais profundas. Um curioso exemplo é Mateus 6.33:

“Buscai, pois, em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas.” (Revista e Atualizada).

No texto grego, a palavra “buscar” é “zeteo”, que curiosamente pode significar tanto “louvar” quanto “conspirar contra”. Tal aparente contradição fica evidente quando analisamos os termos derivados “zetema” (“debate”) e “zetesis” (“contenda”). Assim vemos que buscar o Reino envolve uma contenda, uma luta. O cristão que está verdadeiramente engajado na busca do reino em primeiro lugar deve estar preparado para enfrentar inúmeras contendas em favor da verdade do evangelho, tão atacada nos últimos tempos.

O ato de buscar (zeteo) o Reino é uma empreitada perigosa, pois ainda que muitos louvem publicamente as virtudes de tal busca, outros creem que o estão buscando, mas, na verdade, conspiram contra ele. Jesus afirmou: “Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda, esse é o que me ama” (João 14.21). Se dissermos que buscamos o Reino de Deus, mas não cumprimos os mandamentos de Cristo, estamos, na verdade, conspirando contra a instauração do Reino de Deus nesta terra.

Em hebraico, o verbo “buscar” é “darash”, que também significa “inquirir”. É como se o cristão que busca o Reino saísse pela rua perguntando às pessoas se conhecem o caminho que conduz ao Reino. Como um detetive, o cristão começa uma jornada em busca das coordenadas que levam à estrada que termina no Reino de Deus. Cristo é o caminho (João 14.6), e somente através dele o cristão pode receber tais coordenadas. O cristão que não busca conhecer ao Senhor e à Palavra de Deus com diligência não está buscando o Reino, mas conspirando contra ele. Isso porque um cristão que não persegue o caráter de Cristo traz vergonha ao Evangelho e impede que as pessoas entrem no Reino (Mateus 23.13).

Do hebraico “darash” deriva-se “midrash”, que significa “investigação”, “tratado” ou “estória”. Na cultura judaica, o midrash é uma compilação de ensinos homiléticos sobre a Bíblia Judaica. Alguns estudiosos defendem que esta palavra é forma pela união de “mi” (“quem”, em hebraico) com “darash” (“busca”). Ou seja, o “midrash” pode ser visto como um ensino concedido somente “àquele que pergunta”, que busca aprender. Isso nos leva a um versículo muito poderoso:

“Quando Jesus ficou só, os que estavam junto dele com os doze o interrogaram a respeito das parábolas. Ele lhes respondeu: A vós outros vos é dado conhecer o mistério do reino de Deus; mas, aos de fora, tudo se ensina por meio de parábolas, para que, vendo, vejam e não percebam; e, ouvindo, ouçam e não entendam; para que não venham a converter-se, e haja perdão para eles” (Marcos 4.10-12).

No versículo acima, Cristo está dizendo que somente aqueles que o interrogam recebem o privilégio de conhecer o mistério do Reino, de modo que passam a ver, perceber, ouvir, entender, converter-se e ter seus pecados perdoados. Isso é muito sério, pois nos ensina que aqueles que não buscam (darash) o Reino, e não são pessoas que perguntam (midrash) a Jesus como chegar ao Reino, não são dignas dele. Não podemos usar a Bíblia para satisfazer nossos desejos ou utilizá-la como instrumento de autoajuda. Devemos pregar a verdade, entre a qual está: “Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus” (Mateus 7.21). Buscar ao Senhor é fazer sua vontade, e não apenas cantar e dizer que somos cristãos. Se não nos engajarmos em uma busca incessante por fazer a vontade de Deus, não poderemos entrar no Reino de Jesus.

Chegamos a um momento em que ou começamos a pregar o verdadeiro evangelho ou seremos consumidos pela “provação que está para vir sobre o mundo” (Apocalipse 3.10), assim como Isaías, o profeta messiânico já havia anunciado: “Buscai o SENHOR enquanto se pode achar, invocai-o enquanto está perto” (Isaías 55.6). Chegará um momento depois do qual não poderemos mais encontrar o Senhor, pois está perto o tempo em que será tirado aquilo que detém o “mistério da iniquidade” (2 Tessalonicenses 2.7). Quem não buscar primeiro o Reino e a justiça deste Reino ficará em outro Reino, hoje conhecido como Nova Ordem Mundial, governado por Moloque.

O que é o Reino? Em grego, o termo para Reino é “basileia”, palavra que está relacionada à ideia de fundamento, pois procede de “basis” e se relaciona com “baino”, que significa “caminhar”. Assim vemos que o Reino é construído com base um fundamento (basis), cujo acesso é permitido àqueles que caminham em sua direção. Os cristãos foram inicialmente chamados “os do caminho” (Atos 9.2), porque rumavam em direção a este Reino.

Em hebraico, reino é “malkuth”, que vem de “malak”, palavra que possui uma gama de derivações curiosas, pois sua raiz é “lak”, cujas letras, unidas, trazem a ideia de “cajado na mão”. Isto é interessante, pois o cajado remete tanto ao reinado quanto à caminhada. O cajado na mão do peregrino funciona tanto para auxiliá-lo no caminhar, de modo que não tropece em nenhuma pedra (Salmo 91.12), como para defender-se de animais selvagens (1 Pedro 5.8) ou de ladrões (João 10.10).

O verdadeiro cristão anda segundo o conselho (melak) aprendido através da leitura diária das Escrituras (Salmo 1.2), que lhe oferece um apoio como de um cajado (pelek), e que o ensina a fugir das ciladas (malkodeth) de Moloque (molek), cujo domínio (malku) jaz no maligno (1 João 5.19).

Todavia, o Rei da Justiça (malk?y-tsedeq), através de seu mensageiro (mal’ak), nos ensina a caminhar (halak) em uma jornada (helek) que conduz ao reino (malkuth), e nos torna embaixadores (mela’kah) da mensagem de Cristo, para que outros possam também seguir seus passos (haliyk). Isso porque a Bíblia nos ensina que “para isto mesmo fostes chamados, pois que também Cristo sofreu em vosso lugar, deixando-vos exemplo para seguirdes os seus passos” (1 Pedro 2.21).

Reino (malkuth) e justiça (tsedeq) estão unidos desde a eternidade através do sacerdócio de Melquisedeque (malk?y-tsedeq), do qual Cristo é sacerdote para sempre (Salmo 110. 4 e Hebreus 5.6). Há dois Reinos, o Reino de Moloch (malkuth molek), e o Reino de Melquisedeque (malkuth malk?y-tsedeq). Muitos cristãos estão presos ao Reino de Moloque, pois não vivem a Palavra de Deus.

Buscar o Reino e sua Justiça consiste em seguir os passos de Jesus, o eterno sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque. Busque ao Senhor, vivendo segundo o caráter de Cristo e anunciando o evangelho. Essa é a única maneira de entrar no Reino de Deus!

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